( Luísa Bessa ) J. N.
A OPA do BCP sobre o BPI começou mal. Não pelo que estava em causa – uma operação que fazia sentido em termos de racionalidade económica, como a proposta de fusão apresentada um ano e meio mais tarde pelo BPI veio confirmar – mas pela forma, com indícios de que o lançamento da operação transpirou para fora do círculo restrito em que estava a ser preparada e chegou ao conhecimento de intervenientes do mercado.
Foi de tal forma que, naquela segunda-feira de manhã, dia 13 de Março de 2006, circulavam rumores sobre o lançamento de uma OPA e houve mesmo quem, inadvertidamente, revelasse conhecimento da operação antes da comunicação oficial. Foi muito diferente do que se passou quando o BPI fez o anúncio da sua proposta de fusão amigável ao BCP, que apanhou literalmente toda a gente desprevenida. O que também vale para sublinhar a diferença da gestão entre os dois bancos e pode perceber-se melhor à luz do descontrole que se seguiu no BCP.
O que se passou, e que está claramente descrito no trabalho dos jornalistas André Veríssimo e Maria João Gago, nas páginas que se seguem neste jornal, levou a CMVM a agir e a tentar perceber o que levou a corretora Lisbon Brokers a efectuar um “research” extraordinário recomendando a subida do preço alvo e a compra do BCP e alguns dos seus clientes, entre os quais Patrick Monteiro de Barros e Joe Berardo, a efectuarem aquisições de papel do BCP poucas horas antes do lançamento da OPA e a venderem dias mais tarde, com significativas mais-valias.
Tudo o que foi apurado não foi suficiente para impedir o arquivamento das suspeitas de “insider trading” no lançamento da OPA do BCP pelo BPI. Apesar de o encadeamento das operações ter tornado evidente que houve beneficiários não foi possível chegar à identificação da origem da fuga de informação. Se tudo se passou como parece, é um caso de crime perfeito.
Claro que podemos estar perante coincidências. Mas quando há coincidências a mais aplica-se o velho ditado das bruxas.
Para haver concorrência perfeita, todos os agentes devem ter a mesma informação. Esse é um dos pressupostos de um mercado eficiente, que funciona de acordo com as regras. Mas no mercado de capitais há sempre alguma assimetria de informação.
Garantir igualdade de acesso à informação e que não há investidores a tirarem proveito próprio de acesso privilegiado é a cruzada da CMVM. Desde a sua criação, em 1991, já por diversas vezes apertou mais a rede e propõe-se fazê-lo de novo, com o conjunto de propostas que tem em consulta pública
A CMVM tem um papel ingrato. Os investidores não apreciam as suas chamadas de atenção e as regras que lhes custam tempo e dinheiro, nem os jornalistas, que vêem dificultada a tarefa de dar informação em “primeira mão”. É verdade que o regime de divulgação de informação relevante é por vezes excessivo e roça a burocracia, sendo que nem sempre se percebem os critérios que fazem a CMVM exigir esclarecimentos nuns casos e dispensá-los nos outros.
Também o regulamento proposto para a informação financeira padece do mesmo mal. Tem propostas manifestamente desajustadas da realidade e outras excessivamente burocráticas e nem sequer vai tão longe quanto é prática em jornais de referência como o Financial Times, que impõem internamente a declaração de interesses dos jornalistas. Mas é preferível ter um regulador que funcione do que um polícia que faz vista grossa às infracções de trânsito. E os jornalistas são os primeiros a perceber as vantagens da credibilidade.
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